Amanhã, dia 21 de junho, a Lei Seca completa quatro anos de existência no Brasil. Mas, a norma, que deveria ser punitiva e, ao mesmo tempo, educativa, não tem refletido tão positivamente na consciência dos cearenses. Segundo dados da Polícia Rodoviária Estadual (PRE), se comparados os primeiros seis meses da lei em 2008, com os primeiros seis meses deste ano, até o dia 17 de junho, o Estado, ao invés de apresentar uma queda na quantidade de motoristas flagrados dirigindo embriagados, mostrou um crescimento de mais de 15 vezes, o que corresponde a um aumento de 1.421% de flagrantes.
 
Nas seis principais estradas federais do Estado, segundo a Polícia Rodoviária Federal (PRF), a situação não foi muito diferente. Em 2009, o órgão registrou 484 flagrantes entre processos administrativos, quando o motorista se recusa a fazer o teste do bafômetro, e ações criminais, quando o teste verifica álcool no sangue. Já em 2011, foram 704 registros, o que representa um acréscimo de 45%.

Conforme a PRE, as estatísticas vêm aumentando ano após ano. Em 2009, o órgão contabilizou 143 motoristas dirigindo alcoolizados. Destes, 66 sofreram apenas processos administrativos e 71 criminais. Já em 2010, o cenário foi bem pior. A PRE registrou 313 condutores que sofreram medidas administrativas e 156 processos criminais, o que totaliza 469 motoristas infringindo a lei. Se comparado um ano com outro, pode-se visualizar um aumento de 227%.

E as irregularidades não param por aí. Os 469 motoristas flagrados em 2010 passaram a ser 2.205 em 2011, o que significa um acréscimo de 370%. Mas, o maior crescimento no número de flagrantes nas estradas estaduais do Ceará foi na comparação dos primeiros seis meses deste ano com os primeiros seis meses de 2011. Enquanto, no ano passado, o órgão contabilizou 386 motoristas dirigindo alcoolizados, neste ano, foram 2.921, um aumento de 656%. O mês que mais registrou flagrantes em 2012 foi o abril, 625 infrações.

Impactos

Para o comandante da PRE, coronel Túlio Studart, o primeiro impacto da lei no Estado foi extremamente positivo, pois, até então, as pessoas não tinham preocupação em relação a beber e não dirigir. Contudo, ele acredita que, se houve uma mudança, não foi cultural, mas, sim, por conta de uma questão financeira, pois o valor da multa por dirigir embriagado é de R$ 956. "A consciência é uma questão cultural, processual e educativa. Venho trabalhando esse outro lado, tentando sensibilizar os motoristas", ressalta.

Ele diz, ainda, que a lei possui diversas brechas e afirma não concordar com diversos procedimentos, como, por exemplo, a retenção momentânea do veículo em vez da apreensão. "Há uma diferença absurda entre os códigos de trânsito, pois, se um condutor for flagrado em uma blitz dirigindo não habilitado, o seu veículo é apreendido e, mesmo se um outro motorista estiver disposto a levar o carro, a lei não permite. Já no caso da embriaguez, o veículo é apenas retido e outro condutor habilitado poderá conduzi-lo", destaca.

Carência

Para Neurismene Oliveira, chefe do setor de Comunicação da PRF no Ceará, a Lei Seca modificou bastante a forma de identificação do motorista que trafega alcoolizado, pois o bafômetro, segundo ela, é uma prova fundamental para o processo. Neurismene ressalta que a carência de efetivo da PRE, aliada à urgência de salvar vidas, colabora para outra falha: ausência de testes de bafômetro em acidentes.

O coronel Studart partilha da mesma opinião. "A prioridade é salvar vidas. Assim, não podemos afirmar quantos acidentes foram gerados pelo álcool", diz.

OPINIÃO DO ESPECIALISTA
População precisa de campanhas
José Wagner de Paiva Queiroz Lima
Pres. da Associação dos Psicólogos de Trânsito

Percebemos que é um consenso entre os cidadãos que a implantação da Lei Seca em todo território nacional tem trazido resultados benéficos para a segurança da sociedade. O aumento considerável do número de notificações com relação à referida Lei, nos últimos anos, é sinal de que a autoridade de trânsito em nível municipal, estadual e federal tem cumprido o seu papel de punir os condutores que desrespeitam as normas de convivência social, colocando em risco a sociedade.

No entanto, para que o cidadão-condutor incorpore um novo comportamento, ou seja, de que ao beber não dirija, e passe o veículo para outro condutor, ou utilize outro meio de transporte, faz-se necessário que os órgãos responsáveis pelo trânsito desenvolvam campanhas de orientação neste sentido. Campanhas didáticas, sistemáticas, de médio a longo prazo, até que a nova informação seja absorvida e transforme a conduta, o comportamento do cidadão.

Campanhas estas de conscientização fruto de pesquisas com as suas mais diversas variáveis, discutidas e elaboradas por especialistas da mídia e estudiosos do comportamento humano para que surtam os efeitos desejados.

E que não sejam campanhas pontuais, ou seja, apenas em grandes datas, feriados, dias santos e outros, mas por um período significativo de seis a 12 meses, em média, para que enfim o processo de conscientização e a mudança de comportamento aconteçam.

Faz-se necessário também que a sociedade organizada, além do poder público, participe ativamente destas campanhas. Fábricas, concessionárias e revendedoras de veículos automotores. Empresas de seguro. A participação dos meios de comunicação social também é fundamental. E as mais diversas organizações que direta ou indiretamente estejam relacionadas à segurança do trânsito e à preservação da vida.

Apenas 4,3% dos processos foram concluídos
Segundo a Lei Seca, aquele que for flagrado dirigindo com 0,6 decigramas de álcool por litro de sangue estará cometendo um crime. O motorista responde a um processo criminal, administrativo, paga multa de R$ 957 e tem a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) retida. Aqueles que se recusam a fazer o teste do bafômetro pagam apenas a multa e respondem administrativamente. Porém, após quatro anos, conforme o Departamento de Trânsito do Estado Ceará (Detran), dos 26.606 processos administrativos, apenas 1.160 foram concluídos, ou seja, 4,3%. 

De acordo com o órgão, os processos ainda aguardam por publicação no Diário Oficial e esse condutores terão a carteira retida por 12 meses. Ainda segundo o Detran, mais de dez mil ações administrativas já tiveram a primeira fase concluída, ou seja, os motoristas foram obrigados a pagar multa e aguardam a conclusão da segunda fase, que se refere à retenção da CNH.

A assessoria de imprensa do Detran informou que cada processo administrativo tem o prazo de seis a 12 meses para ser concluído em função das três instâncias de recurso a que o infrator tem direito, conforme a lei. Segundo Paulo Ernesto Serpa, assessor do órgão, são esses recursos os responsáveis pela demora na conclusão dos casos. Ele explica que muitos motoristas desaparecem e não vão deixar a CNH no órgão. Portanto, continuam circulando ilegalmente com a carteira até cair em uma blitz ou precisar renovar o documento.

Ainda de acordo com o órgão, das 26.606 multas aplicadas durante os quatro anos da Lei Seca, mais de 18 mil foram na Capital e outras oito mil no Interior do Estado.

Mudança
A respeito da possibilidade de mudança na lei para evitar as brechas que existem atualmente, o comandante da Polícia Rodoviária Estadual do Ceará (PRE), coronel Túlio Studart, afirma que, se a Lei Seca fosse cumprida e a população respeitasse as regras, não haveria necessidade de modificação. Entretanto, como esse tipo de postura não existe ainda, Studart é a favor de punições mais enérgicas.

Ele explica que, a partir da mudança na lei, que já passou pelo Senado e aguarda aprovação na Câmara dos Deputados, outros meios poderão servir de prova para detectar se o condutor estava embriagado, como filmagens e testemunhas. O projeto também prevê o aumento rigoroso das penas para motoristas embriagados que se envolvem em acidentes que provoquem morte ou lesão corporal.

As penas podem variar de seis meses de prisão, para quem apenas for flagrado dirigindo sob efeito de bebidas alcoólicas, a 16 anos nos casos em que o ato de dirigir bêbado resulte em acidente com morte. Para reverter essa realidade, Studart começará, a partir do próximo semestre, um projeto em duas escolas de Fortaleza e a expectativa é ampliar este número o quanto antes.

De acordo com a assessoria do Detran, o órgão continua com blitze diárias. São quase 700 operações mensais, com intensificação a partir de quinta-feira. O Detran ainda promove campanhas, alertando para o perigo no trânsito.




Fonte: Diário do Nordeste 

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