CPMF OU SEMELHANTE Setor produtivo se opõe à criação de novo imposto

Movimentação política em torno da questão já causa insatisfação antecipada de economista e empresários cearenses
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Apoiada pela maioria dos governadores do Nordeste em reunião realizada com a presidente Dilma Rousseff, na última segunda-feira, a possibilidade de recriação da CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira) vem se robustecendo e ganhando a antipatia de analistas e do setor produtivo. 

Ainda que tenha o objetivo de financiar a saúde, uma das mais delicadas área do País, o tributo não é aceito como forma ideal de reparar as falhas desse sistema. Para o economista Célio Fernando Bezerra de Melo, a saúde nacional realmente necessita de recursos urgentes, mas, segundo argumenta, incrementar a carga de tributos brasileira não é solução.

"O problema não é o tamanho de nossa carga tributária. Outros países, a exemplo de Noruega e Suécia, possuem valores mais elevados. A grande questão é a aplicação equivocada dos recursos obtidos por meio da arrecadação desses impostos", enfatiza.

Efeitos colaterais
De acordo com o economista, a CPMF tem efeitos colaterais que acabam prejudicando toda a cadeia produtiva. Para ele, a criação de qualquer tipo de tributo, na atual conjuntura econômica do País, não é válida, mesmo que seja de uma alíquota de apenas 0,1%, como prevê a proposta da nova CPMF.

Em linha de raciocínio semelhante, o presidente do Sindicato Varejista e Lojista de Fortaleza (Sindilojas), Cid Alves, acredita que o Brasil já possui superávit de receita, e portanto, é "absolutamente desnecessário" o retorno do tributo, extinto desde 2007. 

"Seja qual for o percentual, seja qual for o destino dos recursos, esse País não pode ter um novo tributo. Ainda mais um imposto em cascata, que já foi comprovado que não dá certo", afirma. Para Alves, se depender do panorama político atual, a tendência é de que a presidente aprove a medida.

"Apesar de ter tomado uma decisão responsável quanto ao salário mínimo, ela vai aprovar o que bem entender, pois a oposição está muito encolhida", diz. Já Célio Fernando avalia que Rousseff está "buscando reduzir os gastos correntes e melhorar os processos da máquina". 

O setor industrial também é contundente opositor ao reavivamento da CPMF. Para Pedro Jorge Ramos Vianna, coordenador do Instituto de Desenvolvimento Industrial do Ceará (Indi), ligado à Fiec (Federação das Indústrias do Estado do Ceará), o câmbio desfavorável, com o dólar negociado a cerca de R$ 1,67, não pode ganhar um outro vilão como parceiro.

Idas e vindas
A CPMF é oriunda de outro imposto, o IPMF (Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira), criado em 1993, um ano antes da consolidação do Plano Real no Brasil. O tributo, como o nome já diz, nasceu com o intuito de ser temporário, mas foi se cristalizando na cadeia tributária, vigorando entre 1º de janeiro e 31 de dezembro de 1994, com alíquota de 0,25% e retornando, três anos depois, já com o nome de CPMF, com alíquota de 0,2% visando à saúde.

Em 1999, a CPMF foi prorrogada até 2002, com alíquota maior: de 0,38%, para ajudar também nas contas da Previdência Social e Fundo de Erradicação da Pobreza. Naquele ano, a CPMF foi novamente estendida. Em dezembro de 2007, o Senado rejeitou a proposta de prorrogação da CPMF até 2011, mesmo com a proposta do governo de redução progressiva da alíquota até 0,25%. Essa foi considerada uma das maiores derrotas do presidente Lula.

Em xeque
"A grande questão é a aplicação equivocada dos recursos obtidos por meio da arrecadação desses impostos"
Célio Fernando Bezerra de MeloEconomista

"Seja qual for o destino dos recursos, este País não pode ter um novo tributo"
Cid AlvesPresidente do Sindilojas

"O câmbio já é desfavorável. Não podemos ganhar outro vilão como parceiro"
Pedro Jorge Ramos VianaCoordenador do Indi-CE

QUESTÃO POLÊMICA

Ministro da Saúde evita apoiar volta da contribuição

Uma das principais pastas envolvidas na questão, ministro da Saúde rechaça a necessidade da CPMF
Em visita ao Congresso ontem, o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, disse haver um consenso de que o setor precisa de mais recursos, além de um aperfeiçoamento no atual modelo de gestão. Questionado se a solução seria a volta da CPMF, afirmou que esse debate cabe a deputados e senadores.



O ministro Luiz Sérgio (Relações Institucionais) e o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), negaram que o governo planeje votar a criação de um novo imposto. Em encontro com governadores do Nordeste ontem, a presidente Dilma Rousseff afirmou que o Palácio do Planalto discute uma forma de aumentar os recursos para a área. 

Parte dos governadores defendeu a recriação de contribuição exclusiva para a saúde, nos moldes da CPMF, extinta em 2007 pelo Congresso, em uma votação que foi uma das maiores derrotas de Lula.



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"É fundamental aprimorar a gestão para que os recursos tenham o melhor impacto possível. E há um consenso de muita gente, médicos, partidos, prefeitos, de que tem que ter mais recursos", afirmou Padilha.

"A CPMF não está na pauta da Câmara. O que teve ontem foi apenas uma discussão, nem há posicionamento do governo, o que vamos ter que falar é em como melhorar o financiamento da saúde, aperfeiçoar o SUS".

Padilha citou ainda a necessidade de um "financiamento estável e permanente para a área".

O líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP), é mais explícito e defende que Congresso e sociedade discutam a criação de um imposto com destinação exclusiva para o setor.

Carga tributária
O Brasil é a nação que possui a maior carga tributária dentre as consideradas principais economias emergentes do mundo, o chamado Brics, integrado também por Rússia, Índia e China.

De acordo com dados mais recentes da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o total de impostos e contribuições recolhidos no País foi de 34,8% do PIB (Produto Interno Bruto), em 2009; enquanto, na China, economia que mais cresce no planeta, o índice se situa apenas em 20% do total.

A Rússia apresenta carga tributária que representa 23% do PIB. Já na Índia, país cuja estrutura tributária é a mais parecida com a brasileira, o total da arrecadação corresponde a 12,1% das riquezas acumuladas.

Levando-se em conta nações de desenvolvimento já consolidado, o Brasil cobra menos tributos, no entanto, perde no que concerne à qualidade e quantidade dos serviços prestados à população.

Cronologia
1993: Foi criado o Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira (IPMF) que tinha uma alíquota de 0,25% e incidia sobre o débitos lançados sobre as contas mantidas pelas instituições financeiras.

1997: O antecessor IPMF vigorou até o fim de 94. Quase 2 anos depois, através da Lei nº 9.311, foi criada a Contribuição Provisória sobre Movimentação ou Transmissão de Valores e de Créditos e Direitos de Natureza Financeira (CPMF).

1999: A contribuição foi extinta em 23 de janeiro de 1999, tendo sido substituída pela IOF até o restabelecimento no mesmo ano. O tributo voltou voraz, partindo de uma alíquota original de 0,25% para 0,38%.

2000: O tributo teve alíquota reduzida para 0,30%, mas o alívio no bolso dos contribuintes durou muito pouco. Em 19 de março de 2001, a CPMF voltou a ser cobrada com o pesado valor de 0,38%.

2007: Na madrugada do dia 13 de dezembro de 2007, o Senado rejeitou a proposta de prorrogação da CPMF até 2011, com 45 votos a favor do tributo e 34 contra (não houve abstenções). Foi uma das maiores derrotas no Legislativo do Governo Lula.

VICTOR XIMENESREPÓRTER

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