ANIVERSÁRIO DE PATATIVA Assaré em festa por seu poeta maior


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Gilmar, que teve o privilégio de conviver com Patativa e gozar de sua confiança e intimidade, descreve o amigo como uma "máquina de fazer poemas. Cego de um olho ainda na infância, a pena de Patativa não foi destinada à escrita, como a de outros grandes poetas, e sim para o voo livre de quem tem a musicalidade na voz primordial da contação. Patativa tinha acessos de produção poética em que ele tremia todos os músculos da face, como se fosse uma máquina produzindo poemas, as veias do pescoço latejando".

A descrição do intelectual cearense é perfeita. Gilmar fala de cátedra, ou melhor, de cadeira, para usar uma linguagem sertaneja. Ele relembra as longas conversas, sentados nas cadeiras de couro, conhecidas como "cadeira do Bodocó", tomando água de jarra, em copos de alumínio, esmerilados com as cinzas do fogão a lenha da casa de taipa de Patativa, ou na calçada de cimento, de onde se avista a Serra do Quincuncá, fonte de inspiração do poeta.

"O que a gente conhece é um pouco do Patativa. Ele era uma fonte, não parava de fazer poesia, de improvisar, de brincar", relembra Gilmar.


Cego de um olho ainda na infância, Antônio Gonçalves da Silva transformou sua realidade em versos
Crato Com uma programação que envolve exposições, Fórum de Cultura e Turismo, mesas redondas, lançamentos de livros e cordéis, shows musicais e apresentações de violeiros, estão sendo comemorados os 102 anos de nascimento do poeta Antônio Gonçalves da Silva, conhecido como Patativa do Assaré, que nasceu no dia 5 de março de 1909, na Serra de Santana, Município de Assaré, e morreu no dia 8 de julho de 2002.
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Para sábado, data do seu aniversário, estão programados alvorada festiva com a Banda de Música Manoel de Benta, Encontro de Poetas e Sanfoneiros Populares, Sarau "Cante Lá, Que Eu Canto Cá"; Volta Ciclística da Poesia Popular; programa de rádio especial sobre a data, missa e desfile de carnaval.

Sete anos depois de sua morte, a imagem do matuto pobre de voz arrastada, manco de uma perna, ainda está presente nas ruas de Assaré. Cada um dos conterrâneos tem uma história para contar sobre o poeta que projetou o nome de sua terra natal para este Brasil afora e até no exterior. Outros fazem questão de recitar um verso inédito do poeta. Dona Zenilda, a mais conhecida fabricante de linguiça da cidade, lembra um Patativa boêmio, que varava as madrugadas improvisando versos e bebendo cachaça.

Na Serra de Santana, onde ele nasceu e viveu a maior parte de sua vida, seu nome é lembrado como "Senhorzinho", o homem trabalhador, pai de família exemplar, que criou a família no cabo da enxada. A filha Inês, que escreveu a maioria dos seus poemas, tem uma verdadeira veneração pelo pai que deixou para a família o maior patrimônio que um herdeiro pode receber: a honestidade, a coerência, a humildade e a altivez. "Mesmo com estas qualidades, meu pai não baixava a cabeça diante dos poderosos", desabafa Inês.

Para o reitor da Universidade Regional do Cariri (urca), Plácido Cidade Nuvens, que tirou Patativa do anonimato, com a publicação do livro "Cante Lá que Eu Canto Cá", ele, além de ter sido a maior expressão da cultura popular, foi também um poeta clássico, erudito que está na galeria dos maiores poetas do Brasil.

Mesmo depois de morto, Patativa continua fascinando os intelectuais. O escritor e pesquisador Gilmar de Carvalho, um dos mais autênticos divulgadores da cultura popular, lançou uma antologia onde consagra a riqueza criativa do poeta popular brasileiro, que rompeu as fronteiras nacionais e chegou à prestigiosa Universidade de Sorbonne, na França.
LITERATURA
Médico relembra fatos cotidianos
Crato. O oftalmologista cearense, radicado em Campinas (SP) desde 1966, João Alberto Holanda de Freitas, escreveu o livro "O Patativa que eu conheci", onde relata sua convivência com o poeta popular cearense. Em 1988, Patativa permaneceu três meses na cidade, hospedado na casa de Holanda, para transplante de córnea e operação de catarata.

A convivência por três meses com a família do médico e dos amigos, os versos, as cantorias, as idas e vindas, os repentes e a sabedoria de um dos maiores poetas populares do País estão agora documentados nas 144 páginas do livro. A obra traz um DVD encartado, com registros dos saraus "noite à dentro" durante a permanência de Patativa na cidade, e impressões do médico sobre o poeta conterrâneo.

Natural de Aquiraz, o médico matava a saudade do Ceará, revivendo com o poeta o sertão sofrido, estorricado pela seca, maltratado pelos políticos, dominados pelos coronéis, mas, ao mesmo tempo, valente na luta contra as adversidades. Ao seu lado, Patativa era o retrato em preto e branco da realidade nua e crua do interior do Ceará, onde o médico viveu sua infância.

Sem Patativa perceber, o médico ia registrando toda a genialidade do poeta, auxiliado por um microgravador enfiado no bolso. Com certeza, o gravador não conseguiu documentar a dor de Patativa tão bem expressa nestes versos: "Gravador que estás gravando/ Aqui, no nosso ambiente/ Tu gravas a minha voz/ O meu verso, o meu repente/ Mas, gravador, tu não gravas/ A dor que o meu peito sente!/ Tu gravas em tua fita/ Com a maior perfeição/ O timbre da minha voz/A minha fraca expressão!/ Mas não gravas a dor grave/ Gravada em meu coração!/ Gravador, tu és feliz!/ E - ai de mim! - o que será?/ Bem pode ter desgravado/ O que em tua fita está/ E a dor do meu coração/ Jamais se desgravará!".

"Patativa tinha hábitos alimentares muito simples, comia pouco, frugalmente. No almoço, se servia basicamente de arroz e ovo cozido. Comia de colher. Concluída a refeição, não dispensava o café expresso, ia direto fumar um cigarrinho no jardim. Não gostava de TV, que não podia enxergar mesmo, mas ouvia o rádio o dia inteiro, sempre ligado em música ou nas notícias", escreve o autor.

Outro fato é que Patativa nunca permitiu a publicação dos versos que fez durante a Ditadura Militar de 1964, que quase o leva à prisão.
ANTÔNIO VICELMOREPÓRTER

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